Vira e mexe eu saio para caminhar. Faço por vários motivos, mas principalmente por que gosto de me sentir em movimento e ainda me ajuda a arejar as ideias, com novas imagens, sons e o pulsar do que vou observando pelo caminho.😎🚶🏼‍♀️

Foi assim que num dia desses, indo para o parque, reparei pela primeira vez em muitas pitangas bem maduras e vermelhas, umas espatifadas, outras esmagadas no chão. Olhei para o alto e a árvore estava carregada. Gostei de ver a abundância.

Aliás, vi mais de um pé de fruta no meio do caminho e despertei meu olhar para buscar mais árvores frutíferas.

Para minha surpresa, achei um pé de amoras enorme e outro com umas frutinhas amarelas – seriam orvalho, ou coquinho? Não sei dizer ao certo, mas o fato é que  me lembrei da Pitangueira que meu pai plantou na casa onde vivi por mais de 30 anos. Na minha memória, o sabor é uma mistura de meio doce, meio azedo.

Meu pai era um homem simples, alegre e amava mexer com plantas, fazer sucos, o de pitanga era um deles. Muito bom imaginar que herdei algumas coisas dele, além da pura genética, por exemplo, o gosto pelas coisas simples, tipo arroz com feijão, comida de interior.

Segui pelo caminho e aquela lembrança me trouxe notas de alegria, meu ritmo de caminhada até se acelerou e confesso que não enxerguei mais as pedras do poema do Drummond. Apenas os sinais de vida da recém-chegada primavera – vermelho, vinho, rosa, amarelo, diversos tons de verde e um sem fim de outras formas e cores vívidas.

Mais adiante, me deparei com um grupo de pessoas batendo fotos. Curiosa, cheguei mais perto para ver o que era.

Uma das casas da rua tinha a entrada decorada em alto estilo para o Halloween. Pensei comigo “- Isso é muito da cultura norte-americana. Será que os donos eram gringos? Ou queriam divertir possíveis crianças que ali moravam ou as que passavam em frente?” Não esperava encontrar isso por aqui.

Devaneios à parte, na entrada da casa repousavam  abóboras de plástico, lado a lado com um meio-boneco maltrapilho e com cara de mal-assombrado. Havia também, bem na direção da porta de entrada, um canteiro sem plantas, que tinha inclusive o formato de hexagonal dos caixões que se veem em filmes e na vida real também. ⚰️ 🎃 🎃🎃

Ele abrigava outro boneco, mas só a cabeça, mãos e pés estavam à amostra. Como se ali estivesse enterrado um esqueleto inteiro! Boa ilusão.

Não fotografei nada. Na maioria das vezes, costumo caminhar em modo off,  sem celular.  Apenas parei uns minutinhos  para fazer o registro mental e  logo voltei para minha caminhada rumo ao parque, onde o ar da manhã é mais fresco e o sol morno que bate por entre as plantas, direto na minha pele, é quase um carinho e presente daquele momento para mim.

Caminhei minhas voltas de sempre e saí de lá impregnada de cheiros, imagens, sons e fragmentos de conversa alheia. Me sentindo, por uma fração de segundo, uma andarilha quase nômade, na observância do pulsar da vida.

À tarde, nesse mesmo dia, precisei sair, dessa vez para uma pragmática ida ao mercado. Também decidi caminhar, mas essa foi uma caminhada diferente. Vi uma cena que não saiu de mim.

Um senhor estatelado no chão, a bicicleta de um lado, ele de outro. Muitas pessoas ao redor. Já estava sendo acudido, aparentemente nada grave. Por um triz, quase esmagado, como as pitangas que vi pela manhã.

Às vezes, a vida tem mesmo as pedras no meio do caminho. Amanhã quem sabe se o Drummond estará presente de novo?

Vera Natale

Author Vera Natale

Sou consultora e especialista em Escrita e Comunicação Descomplicada. Ajudo empresas e pessoas a traduzir ideias e projetos em palavras fáceis de entender e comunicar no seu dia a dia, por meio de técnicas criativas.

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